terça-feira, 17 de julho de 2018

Ofício II

Tinha apenas cinquenta minutos para construir uma história.
O propósito era sómente ver as letras a acumularem-se, arrumadinhas no papel por ali fora.
Não era papel, era uma página em branco que precisava, urgentemente, ser preenchida.
Rochas enormes e redondas vieram-lhe, então, à memória.
O granito.
O homem que cavava a terra com o arado que uma parelha de bois puxava, um #ofício morto, como ele, enterrado juntamente com meia dúzia de palavras velhas.
As galinhas eram decepadas pela avó. Pela avó não, se bem me lembro, pela empregada.
Às vezes, andavam ainda uns metros com as cabeças cortadas.
Havia um baloiço na oliveira que também tinha entre os ramos uma casa de madeira.
Havia livros. Muitos livros no meio do gelo, ou do calor insuportável.
Já só lhe restava meia hora.
A cal da parede de outras vidas, mais pequenas, fica para outra ocasião, os bancos à porta de casa, o Alentejo direito, liso,com as cascas dos sobreiros cortadas, e a pele castanha dos seus troncos mais que dignificada.
Dez minutos foi, afinal, o que foi preciso para que não tenha escrito absolutamente nada de interessante, mas acabou-se-lhe, naquele preciso momento, o tempo que não acaba.








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