quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Era muito difícil a sua língua de sapo não  apanhar um ou outro mosquito, dentro de um dos muitos refúgios amarelos 
Que ali havia, certos restos de flores escondidos no mau tempo, 
Que o inverno deixou para trás
A aura dos felizes tende a iluminar o natal de todos nós.
O monte das prendas, embrulhos encavalitados por tamanhos, estremeceu.
A fada das violetas na bandolete saíu detrás  de um presente, ou separou-se do papel azul em que a timbraram, e falou com -----‐, 

domingo, 26 de dezembro de 2021

A aura dos felizes, com cabelos enfeitados de violetas
Restam as flores que o inverno se esqueceu de levar
Os pinheiros de natal em pose

Meia dúzia de flores que o inverno se tem esquecido de levar com ele.

Os pinheiros de natal, em pose altaneira, olham o que os rodeia.

Havia uma grande ilha, num oceano qualquer, desses que nos rodeiam a todos, onde vivia uma estranha criatura de deus.
A sua vida errante obrigava-o a não se dar  a conhecer, pois nada o ligava a outras pessoas, nem a lugar nenhum.
Atravessava as aldeias, as vilas e as cidades, com passo igual, nem absorvia o bulício urbano, nem tão pouco abrandava o passo para subir montanhas, ou para apreciar  uma bela paisagem, ou para atravessar uma tempestade para se abrigar,
Entrava nos estebelecimentos de venda de alguma coisa indispensável, percorria os corredores em silêncio,  se a não  encontrava,  saía e procurava noutro lugar, ou simplesmente, desistia e regressava ao , em cima das suas próprias pernas, que só paravam para descansar.

sábado, 18 de dezembro de 2021

ESPANTALHO

Na horta do Manel Gaibino havia um #espantalho que se sentia muito sozinho.
 Fora feito com o velho pau de uma enxada, umas calças de ganga que já ninguém podia usar, nem para os trabalhos do campo tinham proveito de tão acabadas que estavam, as franjas de uma vassoura de varrer as lajes para servir de cabelos, uma cabeça  de saco de serapilheira pintada com dois olhos grandes, e uma boca vermelha e sorridente debaixo dos riscos de barba preta muito bem aparada pelas mãos do artista que a criou com todo o preceito.
O espantalho era a figura mais alta dos campos de couves e tomates e pimentos, semeados na terra em pequenos alfobres e dispostos sobre ela em retângulos e quadrados de vários tons de verde, ponteados de um ou outro fruto já maduro e vermelho.
Quando vinham os pássaros, o boneco procurava fazer a sua pior expressão para os afugentar e eles lá saltavam para os campos de outra pessoa deixando as sementes ou os frutos sossegados, e assim ia entretendo os dias.
O Ribeiro, dono do terreno ao lado, via o seu milheiral sendo invadido, não que não gostasse de observar as aves rasando em vôos pequenos as espigas, ou saltitando por ali, acontece que lhe arruinavam a colheita, o que não  podia ser, e resolveu fazer como o vizinho e construir, também  ele, um espantalho  que lhe protegesse as terras.
De forma que se pôs  à procura de material velho e inútil que andasse por ali, desusado nos cantos, mas que de alguma maneira causasse aflição  e lhe mandasse bem para longe as aves invasoras.
O acaso fê-lo dar conta de uma cabeleira de carnaval de tiras lilases brilhantes e com reflexos de metal, uma bata de tecido estampado com  grandes ramos e esgotada pelos anos, e uma saca branca de tranportar o pão , em tempos, e que era ideal para encher de palha e moldar uma espécie de corpo. Com engenho, haveria inclusivamente, e com o auxílio de duas cordas pequenas, simular uma cintura e uma cabeça  num dos extremos.
De forma que, passados uns dias, o Ribeiro afiou melhor a estaca que sustentava o boneco já  pronto, e espetou-o no ponto mais alto existente no seu talhão de terra.
Do outro lado dos limites do terreno, entre os pequenos montes de cebolas que, após arrancadas da terra, esperavam ser entrançadas e penduradas em ganchos de parede e um alfobre de alhos acabados de semear, alguém observava a manobra com curiosidade e, quando o homem se foi embora, fixou totalmente os seus olhos sempre imóveis e espantados naquela figura, em tudo idêntica  a si, que, ao sabor da brisa estival, se balançava quase impercetivelmente. Tinha uma boca tão bonita, de caneta de feltro, das que utilizamos para pintar nos livros de colorir as bocas e os morangos, uma cintura cingida, um bonito vestido e um pescoço muito branco e, de onde se encontrava,  conseguia ouvir-lhe o restolhar do papel metalizado dos cabelos através do silêncio do campo. 
Mas veio o inverno, a brisa tansformou-se em vento, os pássaros  em chuva intensa, o verde mal se manteve, dando lugar quase absolutamente ao castanho, e os seus corpos desajeitados e sem vida foram arrancados da terra lamacenta e caíram ainda mais mortos e frios no terreno alagado.