sexta-feira, 10 de abril de 2015

Os Peculiares. Epi.6 "Ux Pecux"

_ Duarte Barroca, olha, cultíssimo! Até sabia onde fica Zanzibar!_ falavam sobre um sujeito que Elba Calhau tinha conhecido à uma semana atrás, e, Celesta Nebrosa, que ouvia a amiga de cigarro apagado numa mão, e isqueiro na outra, com a boca ligeiramente aberta, prestava toda a atenção.
_ E tu, sabias?_ Não, mas tu sabex que a minha paixão é a poesia. Ouve só o que eu escrevi ontem_ e Elba Calhau, de olhos pequenos e turvos, pôs-se a recitar:
Amo-te de tal maneira
Que tropecei na mangueira
Quando fui ao jardim
O meu amor é eterno
Excrevo-o nexte caderno
Que até me cheira a jaxmim
E quando formux bem velhux
E usarmux aparelhux
Seremux só ossux, enfim!
_Ai! Que bonito Elba! E o Duarte gostou?
_Sim, só disse que também ficava "cool", "pudim" e "chinfrim".
_Ó Elba, se calhar o "seremos só ossos" também é um bocado esquisito_ mas, calmamente, Elba explicou: _Não te exqueças que ax pessoax passam o tempo a fazer dietax, e às vezes só no fim da vida é que ficam mais magras. Faz todo o sentido.
_ Pois é...! Tu tens talento, Elba!_ Elba também acendeu um cigarro.
A esplanada onde estavam, não era mais do que duas mesas e as respetivas cadeiras, em cima do passeio, com vista para uma rotunda cheia de carros a buzinar. Estava uma temperatura amena, e a nossa heroína tirou o casaco, enquanto lançava ligeiramente os grandes seios para a frente. _O homem é um expetáculo, sabe tudo! É verdade, temux algum meeting marcado com ux "Pecux"?_
_Como?_ Celeste não entendeu.
_Sim, um diminutivo para peculiarex. Não é um nome giro para nóx, que somux um grupo tão forte?
A Celeste Nebrosa pareceu-lhe um nome bonito.
Ai! Se não fôr eu a dinamizar exte pessoal! Olha, mudando de assunto, Extou a começar uma dieta. Passei o inverno a comer feijoada e cozido! Hoje só comi alface e pepino! Amanhã é tomate! Até me apareceu fazer um poema sobre isso. Queres ouvir?
Com o que comex hoje
Engordax no outro dia
Tenx que passar alguma fome
Para não ficarex enorme
E evitar a azia
Come laranja e kiwi
Que só é bom para ti
E anona e papaia
Para te caber a saia
No evento da Lili
Celeste olhou para a amiga e fez um sorriso forçado. "Não me digas que está vai passar a tarde a fazer rimas". _Mas fala-me do Duarte. Então é o Abel Dade de Pessoa? Já estava a imaginar a tua assinatura: Elba Calhau de Pessoa...!
_Isso já é história. Com o Duarte Barroca extou em sintonia intelectual, e ele adora o que eu excrevo. Até já lhe dediquei um poema. Ouve só:
Meu príncipe, meu Apolo
O homem da minha vida
Adoro ir para o teu colo
Quando extou toda partida
O teu casaco extá sujo
Max a tua mente extá sã
Por isso é que eu não fujo
Já o disse à mamã!
Elba bebeu um golo da cerveja para aclarar a voz, e continuou:
Tive muito namorado
Até já tive um marido
Ele há gajux por todo o lado
Max tu éx o maix querido!
"Porra! Tem cá uma memória! Se fosse eu já tinha trocado aquela merda toda"_ Tu és linda por dentro, Elba! Então e o meeting? Marcamos para amanhã? Podia ser no "Filhos de Cabra"! É um bar tão giro! Só serve tostas de cabrito montês acabado de nascer!
_Axo ótimo, marcamux já pelo Face. Devem ir todos. Por muitax voltax que a minha vida dê, nunca maix me exquecerei dux "Pecux"! Ixto é duma intensidade! Olha, fix um poema sobre cabritux monteses acabadux de naxcer! Querex ouvir?

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Eu vou com o mar

O maluco percorria a praia
no chapinhar das ondas
e gritava: Eu vou com o mar
eu vou com o mar!
Ou os olhos azuis, salgados
Na pele morena
fixos em ti
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!
Os pés marcavam fundo a areia,
por segundos
Os pés limpos de morrer
As calças molhadas
enroladas debaixo das rochas
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!
O maluco perscrutava,
com os olhos límpidos
transparentes
a água
Eu vou com o mar!
Apanhava seixos redondos
que voavam em três toques rasantes
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!
E tu com medo azul e negro
A maluquice do maluco
a passar para ti
o mar imenso
inofensivo e tranquilo
eu vou com o mar
eu vou com o mar!
As belezas todas
o apelo das gaivotas
os olhos metálicos do doido a entendê-las
os teus olhos receosos,
algas em movimentos basculantes
muito longe dali
Eu vou com o mar
O maluco, quando não gritava
mexia os lábios
todos os dias assim
e tu,
Sentado na areia
nem uma palavra!
O oceano sem tamanho
o maluco bronzeado do sol,
e tu, ali, pequeno e esbranquiçado
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!
Sentou-se ao teu lado, nas dunas
os braços à volta dum joelho
a outra perna esticada
e tu à espera
o sal colado na pele
imaginando onde chegava
o seu olhar sem fundo.
Imóveis.
Até a lua cheia formar os seus caminhos
de prata bonita
na noite infinita
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!
Tu,
no frio da noite maldita
chegas-te ao mar
para sentir a água tépida nos pés
Eu vou com o mar
vamos com o mar sossegado
vamos com o corpo
eu vou com o mar!
A água pela cintura,
numa mistura ofuscante
de sons brilhantes,
odores flutuantes
Eu vou com o mar!
O maluco ao teu lado,
delirante e feliz
a pele sem fundo
os olhos da cor do horizonte escondido
refletido em ti.
Eu vou com o mar
Eu vou com o mar!