sexta-feira, 11 de maio de 2018

Amélia


Pode, até, ser um  corpo que observamos,
atentos aos gestos habituais da criatura,
mínimos, repetidos sabe-se lá quantas centenas de vezes,
como aquele seu velho hábito
de empurrar os óculos para cima com o indicador da mão direita,
o dedo espetado, com a unha comprida e vermelha.
(Aviso para os perigos da possibilidade  da #Amélia de ser uma invenção).
Também dava um bom nome para  formiga,
a viver no alto de uma cidade soberba,
com as suas amigas, sempre a trabalhar,
ou daquelas que sobem e descem as ladeiras de uma aldeia qualquer,
ou  sobem e descem as paredes de um prédio rústico,
ao lado das plantas que trepam as ruínas
daquilo que é uma casa a morrer.
Amélia levou os seus cães a passear às dezoito e quarenta,
dez minutos depois de chegar a casa.
Amélia também, é necessário sublinhá-lo,
naquela sua forma impossível, era só mais uma.
Os filhos da Amélia, dessa Amélia,
que imaginamos em determinado lugar,
será a que bebe um café ao balcão de uma pastelaria,
num subúrbio qualquer,
ou uma que ordenha  a vaca de leite,
ou outra, ainda,
a mulher que dá de mamar aos seus filhos,
ou até pode ser o próprio animal,
porque também é um belo nome para uma vaca mãe de vitelos,
ou, e isso já é lamentável,
uma terceira Amélia os corta os vitelos às fatias
para uma  quarta Amélia comer.
Amélia é uma invenção, insisto,
É quase uma imagem que chora numa banda desenhada,
com as cores preenchidas numa perfeição irreal,
e não tem duzentos anos de sonhos inconscientes,
porque ninguém anda por cá tanto tempo!
Também podia ser a Amélia tonta,
esparramada sobre o balcão,
ai os olhos daquela Amélia,  húmidos da cerveja, encantadores!
Ou alguém inconsciente, que acabou de perder os sentidos
e em frações de segundo, foge-lhe a identidade, a essa Amélia,
personagem de um filme policial.












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