sexta-feira, 19 de abril de 2019

Nem por isso

Tal como fazem a grande maioria dos jovens, também ele ía para todo o lado sem chapéu de chuva.
Por isso aproveitou uma aberta no céu, e saíu de casa na esperança que o S. Pedro não o arreliasse com uma chuvada daquelas que nos estragam o resto do dia, por causa do desconforto de ficar com as roupas molhadas e frias coladas a nós.
Apesar dessa possibilidade,  arriscou. Arriscava sempre, pois não gostava de andar com aquele empecilho atrás, temendo perdê-lo e ter de ouvir um a descompustura da mãe,  para além de ter de carregar um objeto  que lhe atrapalhava os movimentos e que interferia na sua bela capacidade de se abstrair do que o rodeava.
Passaria o tempo a ter de se lembrar onde o tinha colocado, ia esquecer-se dele em vários sítios, ia ser obrigado a voltar para trás à porta dos cafés e dos bares. até, finalmente, lhe perder de vez o rasto.
Quando a Dona São arrastou uma das muitas cadeiras para limpar melhor o espaço, antes de o fechar e ir para casa dormir, percebeu que  ela não se movia, trancada por uma das pernas a bater em qualquer coisa. A mulher, já cansada de tantas cadeiras e outros móveis para deixar limpos e arrumados, começou a puxá-la com a maior das forças, mas ela não cedia nem por nada.
Ao baixar-se, já saturada de fazer esforços, para entender o que lá estava por baixo  impedindo a passagem, viu o  chapéu e sentiu uma enorme raiva dentro dela.
Ele que venha cá buscá-lo, e ver se não lhe dou com ele no lombo, pensava, irritada, mas lá conseguiu soltá-lo, apesar de partido em vários pedaços.
O rapaz entrou no estabelecimento a tempo suficiente de ver o estado em que ele tinha ficado.
A sua irritação também foi bastante. Quem era aquela mulher para destuir as coisas que não eram dela? E pediu-lhe satisfações.
A raiva alimenta a raiva, já sabemos, talvez por isso começaram ofender-se mutuamente, "#estudante da treta, só queres é copos", e "velha do caraças não tenho medo de ti!" foram as melhores das frases no meio de tantos impropérios, e iniciaram o arremesso de pequenos objetos um contra o outro, tais como beatas dos cinzeiros por despejar, caricas das garrafas de cerveja, restos de fruta das sangrias, e até mesmo o líquido que repousava no fundo dos copos deixados nas mesas.
No momento em que deixou de haver projéteis disponíveis a dona São tirou um apito do bolso da farda e gritou "Stop", acabando com a batalha.





















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