quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

A Avó Lina

De manhã, quando o sol incidia sobre o espelho da casa de banho, era a altura melhor para tirar os pelos indesejáveis que lhe apareciam no queixo.

Preparava-se para abrir o saco do tricot, enterrada no fundo da cadeira com os pés envoltos nas pantufas para ver televisão, quando a campaínha tocou.
Dirigiu-se contrariada à porta, mas quando ouviu a voz da neta pelo intercomunicador, alegrou-se e abriu-a, satisfeita.
A esta hora? sorriu, não faz mal, podes vir à hora que quiseres. A casa é tua.
Venho apresentar-te o Pedro. Falei-lhe tanto de ti que deseja conhecer-te.
No ato de cumprimentar o rapaz, a avó Lina percebeu-lhe qualquer coisa de muito invulgar.
Não sabia explicar o motivo para aquela sensação tão forte e real, o ligeiro mau estar que lhe tinha causado, o seu olhar violeta, que, aliás, se tinha cruzado com o dela apenas por frações de segundo.
Percebeu que seria melhor chamar a neta à parte para lhe dizer do aviso que os seus sentidos.
Mila, vem comigo à cozinha. Quero mostrar-te uma coisa.
Enquanto se dirigia a um armário simulando um interesse natural, foi perguntando. De onde conheces este rapaz?
Mas antes que pudesse responder, já ele se encontrava encostado à ombreira da porta, de sorriso enigmático plantado no sembante pálido.
A avó Lina tirou um copo, encheu-o de água, bebeu uns golos, e colocou a restante no vaso pendurado no canto da janela.
Desviou o seu corpo, alto e esguio para ela e a neta  poderem passar, e seguiu-as de regresso à sala.







Sem comentários:

Enviar um comentário