segunda-feira, 4 de março de 2019

Separação- 4 final




Lá vem ela. Não vai ter lugar para estacionar o tapete voador, é sempre difícil aqui no centro da cidade.
Será que me trouxe o xarope para a  pachorra, como lhe pedi? Não é a primeira vez que se esquece do essencial.
Já lá vão vinte anos desde que trabalha cá em casa e sempre foi assim. Esquece-se das coisas, não é apenas agora, por causa da idade que avança.
Ou então troca os meus pedidos, talvez por ouvir mal, outro dia disse-lhe, não se esqueça do papel higiénico, apresentou-me produtos transgénicos. Um horror!
Ia dar-lhe uma palmada, mas depois lembrei-me que isso não se faz, e desisti. Também porque fui sensível às suas limitações auditivas, afinal foi o som que a enganou.
Puxou o travão de mão, saltou da carpete, como pôde, acabou por a deixar em cima de uma árvore onde não se paga, mas também são péssimos lugares, as pessoas atrapalham-se  caem, e esparramam-se no chão sujando o passeio com as compras, beterrabas, os meus tomates e as minhas cenouras, os meus bolos de arroz cuja caixa se abriu na queda.
Desgraçada que me estavam mesmo a apetecer para o lanche, isso e um chá que comprou, naturalmente errado. Que raiva!
Vou-lhe rosnar e ela vai perceber, ou não..., a ver...
Vem arrotando a chamuça que comeu pelo caminho, que já sabe que lhe cai mal, mas teimosa..., e eu que aguente o caril requentado preso na atmosfera.
A seguir irá para a cozinha, separar os animais em peças, sobre a bancada. Agarra num cutelo e pimba, pimba, é essa a música que terei de ouvir, durante toda a manhã,  Os olhos dos peixes vão passar por mim, a rasar, já sei, isto se algum não me acertar.
Ai a minha vida...

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