quinta-feira, 14 de maio de 2020

Seguimento De Rascunho Para História

_Não vou acertar nada. Não é para que todos leiam, são frases libertadoras, redentoras, talvez. Vou deixá-las ficar ficar sem nexo, enquanto observo os patos a voar, outra mentira das minhas,  porque os patos não demoram nem três segundos a percorrer o curto espaço por que é composta a minha janela.
Contrariamente ao habitual, tinha uma capa negra a cobri-la, ou talvez não tivesse, mas o candeeiro junto ao muro que a alumiava, nessa noite estava apagado e não era apenas ela que se vestia de escuridão.
Estranhei, mas com Lídia tudo era possível, que mudasse, os gostos, os objetivos, a direção, o estado de espírito, com a rapidez e a elegância de um felino e a violência de uma tempestade, de forma que fiquei a ver se empurrava a velha porta para entrar na casa devoluta, coberta de hera forte que serpenteava os seus troncos entre as pedras, entre os buracos onde outrora tinha havido vidros transparentes e a madeira dos caixilhos houvera sido jovem e bela.
Entrou. Nos primeiros minutos, nada aconteceu, mas, ao fim de algum tempo, uma eternidade para quem está com pressa ou um lapso insignificante para quem nada tem agendado que fazer, pareceu-me ver desaparecer a casa, lentamente, que todos os seus átomos se iam desligando, e que, deixavam entrar a noite pelas suas disjunções, e a casa e as árvores do seu jardim, tudo o que os envolvia, se tornou tão fino e tranlúcido que acabou por se misturar completamente nas vivendas da rua de cima, no café do senhor Joaquim, lá ao fundo, à esquina e na pequena mercearia para lá da estrada.
Desde essa noite, nunca mais vi nada de extraordinário, ne terreno baldio em frente a minha casa, a Lídia parece-me estranha, ausente,e o gato, até o meu simpático e adorável gato, recusa deitar-se nas suas pernas e evita  a sua companhia.

Sem comentários:

Enviar um comentário