terça-feira, 24 de abril de 2018

Kansas

Naquela época eram vigorosos pais de família, mas agora andavam curvados, acompanhados um do outro, os dois velhinhos.
Ele hoje ia sózinho, e, pelo que me disse, calculei assim que o vi a pesquisar no corredor da fruta, não era difícil, a esposa ou teria morrido ou estaria doente.
Não sei que estranhíssimas associações de ideias eu fiz, completamente soltas, mas ao falar com ele, lembrei-me de uma jovem senhora que trabalhava na farmácia, por esses anos, com uma grande cabeleira loura, desproporcionada.
Um dia observá-mo-la, eu e uma amiga minha, a levar um horror de peso em sacos de compras. Ao marido, conhecia-mo-lo de vista, encostava-se muito à esquina do café, a ver as raparigas que por ali andavam.
Atrás disto, e não sei porquê, fui buscar um outro, que delirava. Entravam-lhe pessoas pela janela do quarto, insólitas, assustadoras e engraçadas.
Eram os medicamentos, ou a doença, não sei, mas permanecia vivo assim.
Tal e qual.
Era muito divertido, admiravam-lhe a sabedoria no intervalo das alucinações, mas era impossível não sorrir perante aquilo.
E então se o ouvinte tivesse um humor perspicaz, e apetência para relatos Quixotescos, melhor ainda.
Ele era do tempo dos livros, e para nos ensinar, procurava neles o que tinham para nos oferecer.
Precisava  lá chegar.  O seu corpo  estava desesperado, estabelecendo  prioridades degradantes, e era por isso, e só por isso, que o avôzinho, estava nú a querer sair do quarto.
Mas, nem tudo correu mal. Duas ou três daquelas figuras mecanizadas chamavam-lhe, generosamente, professor.
Também no #Kansas sobem para as camas altas, as crianças, para dormir, muito longe daqui.

























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