sexta-feira, 3 de maio de 2019


Pelas ruas não se vê vivalma.
A meteorologia não ajuda a que se permaneça agradavelmente  ao ar livre, embora há muito tenha parado de chover.
Passo, apressada, esperando a próxima batelada de água, até porque não há  tempo a perder , neste trajeto desconfortável.
Pela infinitésima vez tenho que contornar o pé da trepadeira que sai de um canteiro raso ao chão, desviar-me um pouco do banco de jardim, demasiado próximo das minhas pernas nuas. para evitar as nódoas negras, tudo para não pisar o charco que cobre todo o passeio, estendendo-se pelas ervas do caminho, e formando um lago.
cuja água brilha moderadamente sob a claridade amarelada do candeeiro.
Atravesso o recinto deserto e mal iluminado, o mais depressa que posso.
 sombras  anónimas espreitam por trás das cortinas. Vultos que mal se distinguem, movimentam-se devagar como se fossem irreiais.
Os astros impenetráveis tomam conta do ambiente, espreitando pela atmosfera densa, e a lua fosca ilumina fracamente  as buganvílias, que lá existem ao fundo.
Imediatamente a seguir, o caminho mergulha numa lúgubre escuridão.
As hastes das plantas, que crescem livres, após terem conseguido alcançar o topo da cerca, debruçam-se agora sobre as escadas por causa das múltiplas flores, roxas e pesadas, que pendem dos seus braços.
tornam  invisível o luar.
Ouço a  agitação das  suas folhas que crepitam como o fogo, movidas pela brisa forte,
Se não me apresso, essa brisa rapidamente ganha força e renasce em vento.
Subo, pé ante pé.
Só quero chegar ao outro lado, para ver os arranha céus erguendo-se e  competindo em altura com a hirta cordilheira de lá do fundo,
Também de lá, quero ver as  poucas árvores  ridículas em frente aos edifícios cinzentos, pela sua pequenez natural.
As montanhas cruas, ameaçam constantemente a cidade.
Para chegar a casa terei de atravessar ruas vazias, escadas sombrias, sussurros do vento, recantos iluminados por luzes frouxas e amareladas, até ao último desvio, o mais perigoso,
 onde teria que suportar os frémitos incompreensíveis e horrorosos, que nos trazem essas vozes bichanadas, que migram como pássaros de outras paragens, e se introduzem dentro das correntes, para cantar.
Passam de uma para outra cordilheira, sobrevoando a cidade escura.
Contornam as edificações monstruosas e labirínticas que aprenderam a aproveitar, fazendo os seu ninhos no cimento, agarrados no canto da  caleira da água que fala com elas ao passar pelo tubo, se por acaso chove bastante, e que elas rodeiam com o seu vôo controlado, quando vêm da caça..
De noite não estão presentes.
Dormem, aquecendo os filhos, fazem tudo isso ao mesmo tempo.
Procurei não fazer barulho com os meus passos medrosos, quando ouvi o seu grito.
A ave solitária aproveitava a penumbra para gritar, em gritos inconfundíveis que não provinham de lado nenhum.
Mas as minhas  solas de borracha não paravam de guinchar, ao serem comprimidas contra o cimento.
Quando ouvi passos atrás dos meus, acelerei a marcha.





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