sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Sintra, Outubro de 2017

Não consigo terminar o que tenho para te dizer.
Já tentei duas ou três vezes, mas, e presumo que este verão interminável tenha alguma coisa  a ver com isso, nem sequer consigo, competentemente, transmitir a nossa conversa aos outros e, de cada vez que o tento, arrependo-me alguns minutos depois,
A verdade, o facto inegável, embora eu possa ter alguma dificuldade em  explicá-lo, é que estou aqui sentada e tu estás à minha frente, e é por isso, e só por isso, que o meu pensamento deveria agora estar virado para uma qualquer coisa de maior utilidade, mas não me consigo abstrair.
Numa das situações, relatei, muito claramente, pensava eu, como é que os pássaros, que se escondem em ti, cantam alguns dos meus versos.
É claro que, quando reli o que tinha escrito, percebi como isso era uma teoria, para além de ridícula, completamente impossível. e eliminei tudo, confesso que até um nadinha envergonhada.
Também tentei mostrar o meu ponto de vista em relação áquela frieza que manténs no inverno. Parece~me lógico que estejas a concentrar as tuas forças para fazer frente às intempéries, e assim o disse, mas entendo agora que o expliquei muito mal.
Houve uma noite, já muito tarde, em que me apercebi de que que todos dormiam, menos nós. Então tratei logo de documentar o acontecimento, e relatei-o, mas não tinha interesse para ninguém, o que é perfeitamente compreensível, e acabou por se dispersar nos dias seguintes.
Se não acabamos a nossa conversa, antes que fiques silenciosa e cadavérica como é teu costume, não há possibilidade, sequer, de insistir nesta estúpida ideia de que as tuas aves se entrelaçam nas minhas palavras, e esse  fenómeno, tão bonito, não vou consegui nunca que alguém o ame com igual entusiasmo, e, obviamente, é daí que me ocorre uma certa tristeza e um certo sentimento de impotência,.
A janela fechada nunca constituiu, para nós, qualquer impedimento, por isso não entendo tanta falta de oportunidade, pelo que presumo que tenha a ver com o período de seca.
Ou então estás zangada, e não queres partilhar mais nada, só porque eu não sei transmitir convenientemente a tua beleza ao mundo.
Prometo, ficará tudo entre nós. Concordo, até, com essa solução,
Encaixa-se muito bem na  tua postura rígida, de árvore velha, imóvel há dezenas de anos, espreitando, insistentemente, pela minha janela da sala de estar.









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