sábado, 20 de junho de 2020

o suspiro

Haveria de ter prosseguido no momento certo. Não agora que já me esqueci.

#Sim, havia o silêncio
nas ruas, nos quartos das
pessoas,
quando um enorme suspiro
se ouviu
pela cidade.
Reverberou
sobretudo junto aos telhados
lá para os andares mais altos,
de janelas vagas, onde a
persistência
do som
se  sente melhor,
se ouve mais nitidamente
o arrulhar
das pombas ocupando
os beirais,
se topam os gatos reinando,
sorrateiros,
rodeando os velhos que
depositam
pratos com sobras de comida
sobre as telhas.

Atravessou o dia e a noite,
silenciou o ganir do cão,
o mocho e a coruja,
a panela de pressão,
assustou crianças, que ficaram
adultas,
irremediavelmente,
naquele momento, tamanha  foi a
grandeza
dos decibeís daquele queixume.

Havia filhos e pais que
dormiam,
mas também havia homens
que sorriam para
as quadrículas
em ocre e cor de laranja
e que
desciam
até à correnteza das árvores.
desfilando todos os dias
pelos passeios
das avenidas,
ou homens que  tinham vasos
pendurados
em velhos canos, nas suas águas
furtadas,
com solitárias flores alegrando,
as invisíveis linhas mestras que
separam
o céu de tudo o resto.

Ocupou os espaços possíveis,
sobrepôs-se ao canto das aves
todas,
originou inclusivamente,
movimentos
sincronizados
para o vento se libertar
das suas amarras,
para fazer balancear o vaso
e para fazer cair
algumas pétalas vermelhas
das flores da
sardinheira
suspensa no ar.

O homem fez uma festa ao
animal,
equilibrado a comer
as cabeças dos peixes,
desfez o sorriso aéreo que lhe
tinha provocado
a manhã luminosa,
debateu-se uns segundos contra
o empeno da madeira e fechou
a janela.









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