domingo, 16 de setembro de 2018

Nau

Procurava companhia nos objetos
sem vida
nas pessoas sem rosto
nos animais sossegados
enroscados numa cadeira
a apanhar o sol tardio
e húmido da manhã de nevoeiro.

Só deu pela  reviravolta quando
sentiu os bonecos inanimados
da televisão
acordados inesperadamente.

Atràs do ecrã
naquele dia lindo de névoa
espreitava o ladrão de
todas as vírgulas possíveis.

O larápio entrava sorrateiramente
no discurso e roubava-as
para depois as enfiar na face de alguém.
Como setas.

Esse rosto cravejado de
pequenas unhas falciformes e sujas
arrancadas ao texto
que ficou sem nenhuma
metia dó.

O derrotado escorregava
por ali abaixo
sem controlo
Nem uma ficou para amostra.

Entrou como quem entra
descomprometido
e  percorreu as linhas com os olhos.
Identificou-as rapidamente
localizou-as
recolheu-as
e fez aquela maldade ao outro.

E os livros nas estantes riam-se
que nem uns perdidos
embora só nalgumas passagens.
Noutras ficaram sem fôlego.
Gostavam daquele jogo
de arco e flecha.


Não brinques com o fogo
cantavam em coro as bolhas bolorentas
entre as bolachas e o café.
Muito bem.
Assim farei cor de rosa.


Foi quando  a água da garrafa borbulhante
nos pediu a todos
o máximo  silêncio. Por favor.

Soaram os tambores.

E tudo para  traçar um #risco pequenino
no papel
que mais parecia uma vírgula.









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