domingo, 13 de agosto de 2017

Sofia

Sofia todos os dias atravessava o salão.
Não podia pisar os mosaicos brancos.
Era um jogo que fazia sempre.
Andava com o máximo cuidado
acertava o passo, concentrada,
para não pisar sequer as arestas ou os cantos,
e, quando se cansava,
a distância entre as portas,
a primeira, por onde entrava,
e aquela por onde tinha de saír, era enorme,
sentava-se no chão.
O vestido, rodado, encarnado, formava um balão.
As paredes eram altas, muito altas,
preenchidas por quadros, e Sofia
primeiro ajeitava a saia,
de forma a ficar redonda,
e escondia as pernas lá dentro
só deixando visível a ponta dos sapatos,
e era dali que observava o vitral ao seu lado,
o zénite nas cores vítreas dos anjos e dos santos.
Depois, levantava-se e prosseguia o seu caminho,
sempre a evitar os mosaicos negros,
mas todas as manhãs, invariavelmente, a mãe,
a acordava deste sonho, beijando
a sua pequena cabeça de cabelos brancos.



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