quinta-feira, 5 de agosto de 2021

É muito fácil falar sobre gatos, eu sei. 
O seu caráter misterioso e as suas posturas silenciosas, tantas vezes impenetráveis, prestam-se ao propósito  dos contadores de histórias, dos observadores deste mundo, sempre atentos, reféns dos  movimentos em seu redor, ainda que seja apenas uma simplória flor amarela que  abana com o vento, ou a rotina da família vizinha, que se mostra em cadências  diárias, ou semanais, como por exemplo o hábito de receber a família para jantar ao domingo,  ou a criança que chora por diversas noites, atacada de algum incómodo, e que nos primeiros meses mal se conseguia explicar, utilizando choros inconscientes, mas que, no presente momento,  já vai pronunciando palavras simples misturadas nos soluços.
E os gatos, quaisquer uns, esticados preguiçosamete no ambiente.
Por isso temos tantos gatos nos contos, nos romances, nos poemas, muito justamente em papeís principais, ou determinantes, ou desenhados em ilustrações para crianças, atípicos e irreais, ou com a normalidade simples dos animais domésticos, acompanhando inconscientemente  um troço de vida dos donos.
Porém, todavia, contudo, enquanto tilintam, desordenadas, as borboletas de vidro pintado suspensas da frágil armação do espanta-espíritos  que pende junto à janela, sujeito à melodia existente no ar, eu penso que talvez o meu animal seja diferente dos outros, caminhando, vagaroso, como o são todos, numa superfície infinitamente branca e assustadoramente  silenciosa, preenchendo  o vazio com a sua solidão.



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