terça-feira, 23 de março de 2021

Rossio

Havia algo de diferente na sua geometria. Modificara-se
Uma praça sem flores, eram  as árvores que suportavam tudo, engoliam o bulício através  das folhas e só se livravam dele com a ajuda da chuva e do vento das tempestades. Nessas alturas, era quando, também, aproveitavam para desembaraçar os cabelos esverdeados, que esticavam para o meio da cidade, até onde a sua elasticidade permitia, os galhos  mais fracos partiam, mas eram recolhidos durante a noite, nem chegavam a ser um incómodo.
Havia um homem que dormia num canto invisível, debaixo de uma varanda baixa de um primeiro andar.
Havia pombas incapazes de pousar nas arestas, pernoitar nelas, voavam para longe, para próximo do rio, para perto das gaivotas, reuniam-se na beira do tejo em pequenas porções de areia.
Atravessei o chão ladrilhado por lá mil vezes, na diagonal, havia sol estampado na água azul da fonte, cujo reflexo me cegava tantas vezes quantas o sol embatia na água da fonte azul sem peixes, nenhuns peixes naquela água redonda, quando podiam muito bem nadar por ali, sem dificuldade, na sua forma habitual de existir.
Eram prateados, todavia, não  estavam lá, mas pareciam-me possíveis, tantas vezes, vivinhos da Silva a nadar.
Havia janelas sem ninguém, espalhadas em redor, eram quadrados, paralelepípedos de vidros espelhados cujas linhas se cruzavam com as da luz.
No ponto de interseção dos pensamentos silenciosos, ficava uma igreja em pedra fria com telhados altos e  pássaros sem casa que por ali circulavam.
Para quem caminha de cabeça  baixa, com as pálpebras semicerradas e as palavras expontâneas a percorrerem-lhe a cabeça enquanto atravessam de um ouvido ao outro, inequivocamente interligadas, porém escorregadias, a praça ficou enorme e lustrosa.
Não estava ninguém,  todavia tanta gente caminhava pela praça imitando a minha forma de andar, os meus passos. Pareciam protótipos de mim. Posso sentar-me por vezes, e apenas por momentos, naqueles bancos de jardim que lá estão.










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