domingo, 27 de novembro de 2022

Porque choram as flores de cera,
ou a chuva por elas?
Tinha as pupilas tão perto quanto bastasse para ver
as imagem invertidas no fundo de qualquer gota,
nítidas, e revelando tudo ao contrário,
contendo ruas inteiras, ou outras paisagens,
um mundo superficial que desapareceria
impiedosamente,
com a aproximação e posterior permanência  do sol, 
em abertas de tempo incerto 
naquele acontecimento vulgar que era mais um outono. 
Estendia as mãos o mais possível, e, 
em bicos de pés tentava agarrar as folhas
que caíam das árvores, enquanto recordava
meia dúzia de memórias inventadas.
Subia o banco de pedra para tentar engrandecer
um pouco o seu pouco tamanho,
saltava de novo para o chão  
e para a  consciência das ervas crescendo à beira do passeio,  
no seguimento duma escassa linha de terra que o acompanhava.
Rasavam-lhe os ombros, tão altas, tão altas... 
até onde  um menino pequeno pode entender.
(Alguém lhe abria a porta para a escada monumental 
e lá dentro  os velhos armários estalavam misteriosamente, 
e assim vivia as coisas).
Os seus olhos de criança procuravam 
constantemente todas as distrações.
Enfiou os pés calçados com botas de cano curto 
dentro de um charco, a mãe, o pai, 
não viram o propósito da ação, 
desconsideraram o gesto,  
pensando tratar-se de aluamento, ou discuido, 
o  miúdo escondido no seu ínfimo tamanho, vivendo à superfície da lua.
Era-lhes difícil imaginar, por isso, 
a importância do ruído que provoca o chapinhar na água, 
ou talvez nem o tenham ouvido, sequer.




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