domingo, 4 de agosto de 2019

O maldito não se deixa apanhar.
Há anos que se mantém definido nas folhas,  mas quando tento fotografá-lo, esfuma-se como o diabo,
não se revela nas imagens que captei.
Todavia está ali, com as barbas ondulando e os grandes olhos transparentes, ou inexisentes, ainda não entendi, que me permitem  olhar  o outro lado da rua através das suas órbitas vazias.
Vejo-lhe a popa formada pelo  cabelo verde, agora, em tempos de chuva silenciosa e novos rebentos, mas no inverno mantém o penteado tal e qual, apenas lhe mudam os tons das madeixas para castanho.
Nunca me falou em nada de extraordinário. Nada de muito bonito ou muito feio, nem fala grande coisa o monstro da árvore, só está ali acompanhando a minha existência, murmurando ao sabor do vento com o seu perfil ondulante.
Se esse vento é forte, e às vezes é tão forte que derruba coisas, nem por isso se desmancha,
apenas  dança com movimentos mais intensos do que o habitual.
O corpo em que se alojou, um grande tronco de árvore velha, parece não lhe interessar, quase paira sobre ele, enquanto me vai avisando com a cadência do tempo a passar:
"Eu venho doutro universo e só tu me vês, só tu me vês, só tu me vês..."


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