sexta-feira, 22 de maio de 2015

O míope

O miopezito lá ia, os olhos franzidos a protegerem-se do sol. E quando era preciso ler as letras pequeninas, lia o que os outros não conseguiam. O míope deitava-se, sob a sua janela de sótão, nas noites de luar, e beleza alguma apreciava, depois de tirar os óculos, os mesmos que tirava para ver melhor!
O miopezito estava escondido por detrás das suas lentes graduadas, fundos de garrafa, disfarçados por inovadoras formas de disfarçar fundos de garrafa, e os seus olhos eram muito maiores do que os que lhe vias, por entre os vidros convexos, sustentados por hastezinhas nas orelhas.
O miopezito, no seu mundo desfocado, transformava tudo em manchas, mas podia ler os mais pequenos rótulos, a informação mais escondida, o pormenor quase apagado, mas o mar era uma sombra,e a noite..., bem, a noite era conforme estivesse ou não com os óculos.
O miopezito tinha até uns grandes olhos de ver o mundo.
O miopezito foi à consulta, apoiou o queixo na maquineta, puseram-lhe uma armação enorme e complexa no nariz. O médico foi trocando lentes, sobrepondo algumas, até!
"E assim? Vê melhor ou pior? Que letra é esta?
"Mas eu lembro-me que era um A! E agora?"
Todas as manhãs o míope apalpava a mesa de cabeceira, e, a seguir, verificava o efeito da luz nas persianas. Não se pode dizer que o miopezito fosse um sonhador, ou poeta, porque não era. Só era o melhor a ler instruções de comida pré-cozinhada, e era o melhor a abrir muito os olhos, só para ver pouco ou nada!

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