"Separou-se do corpo,"
era só o que pensava desde cedo,
evitando olhar o espelho
para não deparar com
o seu sósia, a rebuscar
noutra coisa qualquer.
Puxava utilidades dos cantos da casa,
e punha-se a remexer
nelas.
Mas a ideia movimentava-se
em pequenas espirais, na atmosfera,
como se movimentam as folhas secas,
rodopiando as cores
"Separou-se do corpo".
diriam os anjos, talvez,
mas premente era agora,
em que urgia
separar o corpo do joio,
o trigo das planícies,
os salgueiros das margens
do rio, um dia viriam
os homens e as máquinas,
e arrancá-los-iam pelas raízes.
Felizmente é cedo.
Ainda hoje me virão entregar
mais uma remessa de palavras,
que gastarei como quiser.
Lá para as dezoito horas.
Tenho a noite toda,
e o dia de amanhã.
"Separou-se do corpo"
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