Casas.
Monstros solitários espalhados pela serra, espreitanto,
envelhecidas pela floresta imparável,
essa que cresce em sintonia com as décadas e com as coisas abandonadas.
Um dia,
resolvem ganhar vida através das imperfeições que o tempo lhes concedeu.
Um buraco no telhado, a intensidade da chuva de inverno batendo com a força de um Hércules,
nos telhados,
nas portadas de madeira,
que cedem pelas dobradiças e quase tombam no chão.
Entra uma brisa em círculos imutáveis pelos fios das aranhas
encontra-se por todo o lado.
acumula-se no orvalho impenetrável da manhã,
deixa-se bordar por entre os galhos indomáveis,
onde brilham as suas gotas no desconforto das folhas desconfortáveis,
até o céu se tornar de um cálido azul impossível.
Casas
que suportam, ainda, milhões de passos fantasmagóricos,
comidas cheirosas em panelas de ferro,
vassouras que varrem o chão novo e encerado,
as paredes negras de cinza negra,
as arcas de sotão nos cantos,
e as nascentes límpidas e frescas dos caminhos,
rios de salgueiros perseguindo um troço de riacho,
como uma roupa envolvente e protetora.
As pedras, blocos de granito mudos há muito,
pois não sentem nenhuma vida dentro delas,
não as há, as crianças cristalinas,
nem os resmungos do velho impaciente para as aquecer,
nem se recordam, tão pouco, de quem ali os colocou, uns sobre os outros
até ao sotão das patas dos pássaros a crepitar nos silêncios da telha seca.
Casas.
As auras dos felizes habitantes foram
as promessas de uma luz sem fim e de um calor proveniente dos cabelos de uma criança,
enfeitados com violetas bravas presas à bandolete.
Até os dois pinheiros perderam a pose toda,
invernos de vento cíclico espalhando por todo o lado as gotas de água acumuladas nas rendas do seu vestidos verdes,
atingindo as gabardinas de quem passa.
Admiravam as últimas flores, aquelas que o inverno se ia esquececendo de levar.
Casas
permeáveis,
sensíveis às estações do ano, aos soís abrasadores,
aos temporais e aos jardins arrancados das memórias, intactos,
como se o tempo não existisse assim.
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