sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Eu, que tinha os olhos alinhados com a água, 
já  lhe tinha percebido a falta de espaço.
Bastara observar a sua superfície convexa 
para entender que as frágeis ligações dos seus átomos
estavam praticamente a ceder.
As gotas caíam, compassadas, 
uma a uma, 
como é de esperar das gotas que tombam das torneiras mal fechadas,
e caíam direitas, perfeitas,
sólidas como aventamos que os líquidos não possam ser.
O ruído foi impercetível. 
Teria sido necessário o silêncio absoluto inexistente
para que se pudesse ter ouvido um tão ínfimo som.
A última de todas elas, lá veio ela,
foi tão suave como outra  qualquer, 
nem provocou turbilhão, 
nem ondas concêntricas muito grandes, 
nem nada verdadeiramente assustador, a bem dizer.
Mas o mal estava já  feito,
Estavam iniciados os movimentos das moléculas
que deslizaram até ao fim do cilindro gigantesco.

E eu, que tinha os olhos alinhados com a água, 
observei-a a agigantar-se contra mim, furiosa e forte, 
como supomos que a água não deva ser.




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