Acordava com o telemóvel que punha para despertar às seis e
dez. Seis e dez equivalia no seu relógio
a talvez umas cinco e cinquenta e seis ou cinquenta e sete, porque o tinha
adiantado uns minutos imprecisos, um tempo que não desse para somar ou
subtrair, porque saber a hora exata, estupidamente o atrasava. Corria para
apanhar o comboio, com medo de tornar fatal um segundo que fosse. Um segundo
era o suficiente para lhe estragar o dia, porque o comboio, a uma hora
demasiado certa fechava as portas e iniciava a sua marcha, primeiro vagarosa, e
depois veloz e barulhenta, e teria que esperar umas dezenas de minutos pelo próximo.
Chegava pois à estação invariavelmente, cinco ou dez minutos mais cedo. No
verão, às sete horas já começa um bonito dia, no inverno pode chover a potes,
e, para além da noite escura, não se aguenta o frio.
No escritório picava às nove em ponto, e depois ia tirar um
café na máquina dos quarenta cêntimos, trabalhava duas horas, interrompia para
beber outro, e trabalhava mais duas à espera da hora do almoço.O meio tempo da tarde passava melhor. Meio dia estava cumprido, e as dezoito horas mais próximas, o momento de dizer até amanhã ao pessoal, e regressar a casa, para o relaxe duma novela ou dum debate de futebol. A mulher faria o jantar, em princípio, claro, porque ultimamente falhava uma ou outra vez, com a desculpa de ter outras coisas para fazer, ou a desculpa do cansaço. Às vinte o telejornal, depois um zapping pelas novelas, e a seguir procurar pelos canais um bom filme de polícias e ladrões, para às vinte e três e trinta, meia noite, se ir deitar, e, se ainda tivesse energia, talvez, quem sabe, faria sexo rapidamente, porque ao outro dia tocaria outra vez bem cedo, o prepotente despertador.
Parabéns! Disseram-lhe um dia no emprego. Atingiu o tempo mais desejado, aquele porque todos esperamos, o dever cumprido, o direito à reforma.
O quê?
Estamos em dois mil e desasseis, passaram trinta e seis anos, senhor!
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